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24 de Abril de 2024
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    MPF/MG divulga nota de esclarecimentos sobre atuação em Escarpas do Lago

    há 8 anos

    Diante das informações veiculadas por meio de várias mídias – site, panfleto, vídeos – sob o mote “Capitólio pede socorro”, objeto inclusive de audiência pública agendada para a próxima sexta-feira, 9 de setembro, o Ministério Público Federal (MPF) vem a público esclarecer que:

    São absolutamente improcedentes as afirmações contidas no material de divulgação, com uma linguagem apocalíptica, em contradição com dados e fatos reais. Senão, vejamos:

    O material de divulgação principia dizendo que paira sobre Capitólio/MG e outras 33 cidades do entorno do Lago de Furnas uma “grave e real ameaça, que poderá resultar numa catástrofe ambiental, econômica e social: desemprego em massa, perda de renda das famílias e uma queda enorme da arrecadação dos municípios”.

    1. Tal ameaça, segundo o texto disponibilizado na página de internet, consistiria de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4901) proposta pela Procuradoria-Geral da República, em Brasília/DF, contra o artigo 62 do novo Código Florestal Brasileiro (Lei 12.651/2012), que reduziu as áreas de preservação permanente ao redor de reservatórios artificiais.

    Inicialmente cumpre esclarecer que a ADI não foi ajuizada contra essa ou aquela pessoa, esse ou aquele município, esse ou aquele proprietário, mas sim porque o artigo 62, ao reduzir as áreas de preservação permanente, violou os artigos , III; , I e 225 da Constituição da República, que compreendem, em especial, o princípio da vedação ao retrocesso jurídico-ambiental, o que é inadmissível no plano dos direitos fundamentais assegurados pela Constituição Federal e os tratados internacionais de que o Brasil é signatário.

    Além disso, e mais importante: a redução decorrente das mudanças no artigo 62 trazidas pelo novo código não se aplica ao reservatório de Furnas. Isso porque o artigo 62 do novo Código Florestal, expressamente, limitou-se a alterar a legislação somente em relação a reservatórios de hidrelétricas cujos contratos de concessão ou autorização são anteriores à Medida Provisória nº 2.166-67, de 24/08/2001.

    Ocorre que o contrato de concessão de Furnas foi assinado em 2004, estando fora, portanto, da incidência da nova lei.

    Isso posto, continua valendo para o reservatório de Furnas os comandos legislativos anteriores (em especial o artigo 3º da Resolução 302/2002, do Conselho Nacional de Meio Ambiente) quanto à definição da Área de Preservação Permanente ao redor dos reservatórios artificiais, fixando a distância de 30 metros do lago para imóveis situados em área urbana e de 100 metros para imóveis situados na zona rural.

    Resumindo: não existe absolutamente qualquer inovação legislativa a respeito e o julgamento da ADI não vai acarretar qualquer efeito em Furnas. As limitações atualmente existentes vigoram há mais de 14 anos, desde a regulamentação imposta pela Resolução 302 do Conama, e são de conhecimento público e notório.

    2. Também não corresponde à verdade a afirmação de que tudo que foi construído (“Casas, Hotéis, Restaurantes, Marinas, Clubes e Pousadas”) será demolido. Grande parte dos imóveis, na verdade, estão regulares. Somente os que estão infringindo a legislação é que deverão obedecer a lei, demolindo a parte da construção que estiver inserida na Área de Preservação Permanente e recuperando a área degradada por suas construções.

    Ou seja, a imensa maioria das propriedades continuará no mesmo lugar e os imóveis comerciais, como pousadas e restaurantes, continuarão operando da mesma forma. E ainda poderão ter à sua frente uma área verde, com mata ciliar e vegetação nativa. Ora, se os ativos ambientais são, hoje, importante instrumento de valorização imobiliária, sendo comumente utilizados inclusive para propagandear os próprios empreendimentos instalados ao redor do Lago de Furnas, não se compreende a razão de tamanha resistência.

    Na verdade, é bom ressaltar que, ao lado de propriedades irregulares, também existem aquelas que respeitam a lei. Um exemplo está no Condomínio Quintas Ponta do Sol, situado em Capitólio/MG, em que o próprio empreendedor fez constar como cláusula especial de compra e venda dos lotes a necessidade de manter intacta a faixa de 30 metros ao redor da represa. Tal cuidado não diminuiu o valor dos imóveis, muito menos o interesse dos adquirentes.

    Então, onde estaria a “catástrofe ambiental, social e econômica” citada no panfleto distribuído pelos organizadores?

    Catástrofe ambiental haverá se a ocupação desenfreada e o desmatamento de mata ciliar e de espécimes inclusive de Mata Atlântica, um dos biomas mais ameaçados do planeta, continuar ocorrendo em prol apenas de interesses particulares. As áreas de preservação permanente dos reservatórios artificiais desempenham papel importante no equilíbrio da biodiversidade, protegendo o solo de erosões e garantindo a recarga do aquífero.

    Além disso, é preciso chamar a atenção da população para um fato: as construções às margens do reservatório podem causar o assoreamento do rio Grande devido à gigantesca movimentação de terra feito pelas construções e ao desmate das árvores nativas e da mata ciliar, que constituem barreiras naturais para impedir que diversos sedimentos cheguem ao leito do rio. Alguns proprietários chegaram ao cúmulo de aterrar parte do leito do rio para aumentar o tamanho do imóvel. Ou seja, os proprietários desrespeitaram inclusive o artigo 62 do novo Código Florestal, pois invadiram a faixa entre o nível normal e a máxima maximorum do reservatório. Peritos da Polícia Federal constataram que há imóvel em Escarpas do Lago que praticamente dobrou de tamanho com essa intervenção ilegal.

    E os prejuízos ambientais já se fazem sentir: no ano passado, a região teve de conviver, no período de estiagem, com a maior baixa histórica do rio Grande (que é o rio mais importante da região Sudeste), com perda inclusive de navegabilidade em alguns trechos.

    3. Outro ponto de suma importância que deve ser destacado é que as áreas situadas ao redor dos reservatórios de usinas hidrelétricas constituem terras públicas, portanto, insuscetíveis de ocupação e de usucapião (artigo 102 do Código Civil).

    Essas terras foram desapropriadas pela União na época da construção da usina hidrelétrica, pois esta necessita de áreas livres para eventual inundação em caso de enchimento do reservatório. As terras desapropriadas ficam sob o domínio da concessionária, mas deverão ser revertidas ao patrimônio da União ao final da concessão. No caso de Furnas, o contrato de concessão previu que essas áreas possuem vinculação direta com o respectivo empreendimento, atraindo para a concessionária a responsabilidade “da gestão do reservatório e respectiva área de proteção, a proteção de sua integridade e o cumprimento da legislação ambiental e de recursos hídricos”, conforme Cláusula Sexta, III, VI e VII do Contrato nº 04/2004 firmado com a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL).

    É de se perguntar então: se as terras são imóveis públicos, como particulares podem nelas construir, já que não poderão ter os respectivos títulos de posse ou propriedade?

    Por essa razão é que a empresa Furnas Centrais Elétricas, concessionária das usinas de Furnas e de Mascarenhas de Morais, é diretamente responsável pela fiscalização das áreas no entorno dos respectivos lagos, devendo evitar ocupações ilegais, inclusive ajuizando as devidas ações reintegratórias de posse. Trata-se de dever da concessionária, e não faculdade.

    4. Os organizadores dizem ainda que a população está sendo surpreendida por uma “inovação”, pois nunca antes teria havido qualquer aviso por parte dos órgãos públicos. Novamente faltam com a verdade.

    Existe um princípio elementar em Direito segundo o qual “Ninguém se escusa de cumprir a lei alegando que não a conhece”. Mas o fato é que não existe tal desconhecimento, porque os órgãos de fiscalização, em especial a Polícia Militar Ambiental (ou Polícia Florestal como é mais conhecida), vem expedindo, ao longo das últimas décadas, centenas de notificações a proprietários de construções irregulares, que sistematicamente teimam em ignorar a lei e a autoridade dos agentes públicos.

    Para se ter ideia, de 2011 até o início da Operação Escarpas do Lago em 2015, a Polícia Ambiental efetuou 60 autuações na região, que foram, em sua maioria, solenemente ignoradas pelos infratores. Durante a operação, foram feitas outras 151 autuações.

    Ou seja, desde sempre, proprietários e administrações municipais estão cientes do conteúdo das leis, mas a maioria insiste em ignorá-las. Foram notificados administrativamente e ignoraram. Foram autuados e continuaram ignorando. Alguns proprietários não respeitam sequer decisões judiciais. Dois empreendimentos de luxo em Escarpas do Lago, por exemplo, foram embargados tanto administrativamente pelo órgão ambiental estadual quanto judicialmente, e mesmo com decisão judicial ordenando a paralisação da construção, os proprietários continuaram as obras.

    O próprio Ministério Público Federal, como órgão incumbido constitucionalmente de fiscalizar o cumprimento das leis, vem atuando há décadas, por meio da instauração de procedimentos de investigação e propositura de ações judiciais, sendo totalmente infundada a informação de que proprietários, prefeituras e a população estão sendo “colhidos de surpresa” com a fiscalização.

    Os únicos interesses possivelmente afetados pela atuação correta dos órgãos ambientais e de fiscalização, assim como da própria concessionária, que não pode se desincumbir de suas obrigações contratuais sob pena de responsabilização, são os interesses privados de alguns poucos particulares, cujas construções, não por acaso os imóveis mais luxuosos da região, estão em terreno da União ou em área ambientalmente protegida (a menos de 30 metros do reservatório).

    Portanto, fica claro que o MPF defende neste caso apenas e tão somente o cumprimento da lei, na defesa do interesse público, da preservação do meio ambiente e da incolumidade do patrimônio público e do bem estar social e econômico.

    5. Finalmente, parece-nos que a mobilização intitulada "Capitólio pede socorro" foi decorrência direta da Operação Escarpas do Lago, um esforço conjunto de vários órgãos: MPF, MP estadual, Polícia Militar Ambiental, Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Furnas Centrais Elétricas. No entanto, as informações veiculadas referem-se ao MPF como se fosse o único protagonista da operação, invisibilizando o excelente trabalho desenvolvido por cada um dos participantes.

    Contraditoriamente, ao formalizar o convite para participação na audiência pública a ser realizada na próxima sexta-feira, os organizadores convidaram os representantes de Furnas S.A. com antecedência superior a 20 dias, somente o fazendo em relação ao Ministério Público Federal praticamente às vésperas do evento. Como não havia membro do MPF com agenda livre para participar, foi solicitado o adiamento da audiência, pedido este não respondido até o momento.


    Assessoria de Comunicação Social
    Ministério Público Federal em Minas Gerais
    Tel.: (31) 2123.9008 / 9010
    No twitter: mpf_mg

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